O custo oculto de demitir

Sempre que investimos em um grande equipamento, moderno, requintado, e avançado, nossa tendência é cuidar deste da melhor forma possível, para que sua performance ideal esteja sempre disponível para entregar a demanda na quantidade e qualidade que precisamos. Queremos que ele dure o máximo de tempo possível, e de preferência no auge da produtividade. Fazemos investimentos astronômicos (e algumas vezes, insensatos) por isso.

Mas quando o assunto são pessoas, sinto que o pensamento é quase o oposto, e que consideramos que a grande maioria delas poderia ser substituída sem maiores prejuízos para o nosso negócio, especialmente se fizerem parte dos mais vulneráveis: aqueles que trabalham na operação. Não nos preocupamos muito em nos esforçarmos para criar um relacionamento de longo prazo, um ambiente onde a sistemática de trabalho e remuneração permita que o resultado seja de ganha-ganha. É como se elas fossem peças padronizadas. Enquanto equipamentos parecem ser algo sempre positivo, algo a se comemorar, pessoas parecem ser sempre algo caro e que incomoda demais.

Entretanto, e se você descobrisse que esse desprezo por um relacionamento duradouro com as equipes pode estar te custando extremamente caro, tanto em custos mensuráveis, quanto em custos imensuráveis?

É sobre isso que vamos conversar neste breve artigo do blog da Leanstart.

“Um time é maior do que a soma de suas partes”

Ken Moo, da The Wharton School da Universidade da Pensilvânia, Prashant Loyalka, de Stanford, Patrick Bergemann da Universidade de Chicago, e Joshua Cohen, da Apple University, colaboraram em um estudo curioso e inovador, sendo este o primeiro a conectar e buscar a relação entre dois fatores da vida industrial: a rotatividade (ou turnover) de pessoas na manufatura e a confiabilidade dos produtos produzidos. Conforme citam os autores, estudos do impacto da rotatividade de pessoas nos negócios costumam ter foco no setor de serviços.

Para este estudo, uma grande empresa de manufatura de smartphones Chinesa (produtora terceirizada para uma grande marca do ramo) forneceu dados de rastreabilidade de defeitos de aproximadamente 50 milhões de aparelhos produzidos, além dos dados sobre a taxa de operação semanal das linhas de montagem, sobre os rigorosos testes de qualidade executados durante o processo de montagem, e as informações do RH sobre o turnover de cada uma das linhas.

turnover é um indicador que mede o “giro” do quadro de funcionários de uma empresa em um determinado período, ou seja, a quantidade de demissões no período em relação ao total do quadro no início do período. No tipo de negócio da empresa estudada pelos pesquisadores, é comum que haja um grande número de pedidos de demissão logo após a semana do pagamento, gerando a necessidade de reposição rápida da capacidade perdida, através da contratação de novos colaboradores.

Como resultado do estudo, descobriu-se que cada aumento de 1 ponto percentual na taxa semanal de turnover, gerava um aumento de 0,74% até 0,79% na taxa de defeitos. Estes se tornaram 10,2% mais comuns em produtos manufaturados em semanas com alto turnover do que nas semanas com uma taxa baixa de substituição de pessoas, além de um aumento de 7,1% a 7,6% na taxa de falhas de produtos que já estavam em pleno uso pelos clientes. E isso, mesmo com um ambiente altamente padronizado, com dispositivos especiais para os testes de qualidade, sendo teoricamente, pouco exigente do nível de habilidades dos operadores, algo que gera a ilusão de que a produtividade estaria segura de possíveis efeitos negativos do troca-troca de pessoas. Agrupando estes aumentos, o prejuízo acumulado chega às centenas de milhões de dólares.

O que nós encontramos a partir dos dados é que se uma pessoa experiente deixou a linha, e você a substitui com uma igualmente experiente, é disruptivo. A pessoa que que saiu tem alguns conhecimentos que não são facilmente substituíveis. […] Mesmo que uma linha de montagem não seja um ambiente de trabalho profundamente colaborativo, ainda há uma necessidade de se coordenar com aqueles ao seu redor. E isso importa. – diz Ken Moon no artigo Employee Turnover Costs More Than You Think (2022)

Por mais que talvez nunca tenhamos parado para pensar em efeitos concretos e quantitativos desse tipo de movimentação (que neste caso, é tecnicamente voluntária), já era de se esperar que houvesse um impacto devido à perda do nível de experiência das equipes. Porém, nem só do nível de habilidade técnica depende a produtividade de um time, mas também, da estabilidade do relacionamento entre seus membros. Nos sentimos bem trabalhando com quem conhecemos e confiamos: um time é maior do que a soma de suas partes, e isso afeta nosso desempenho e resultados. Onde há pessoas, há fatores sociais e comportamentais. Temos os conhecidos custos de tempo (e que se refletem financeiramente), do retrabalho do RH e dos supervisores com treinamento dos novos colaboradores, mas estes não são os únicos. Precisamos com urgência parar de pensar apenas de forma linear e mecanicista.

Como dizem no Pensamento Sistêmico:

Não existe efeito colateral. Existe apenas efeitos sobre os quais você ainda não pensou. – James Paine na aula System Dynamics: Systems Thinking and Modeling for a Complex World (2020)

Espero que tenha gostado desta breve reflexão.

Um grande abraço, e até a próxima.

Algumas Referências

Employee Turnover Costs More Than You Think. Disponível em:<https://knowledge.wharton.upenn.edu/article/why-employee-turnover-costs-more-than-you-think/>.

MOON, K. et al. The Hidden Cost of Worker Turnover: Attributing Product Reliability to the Turnover of Factory Workers. Management Science, 14 mar. 2022. 

 

  • dezembro 28, 2022